Gente de bem

Brasil segue em risco e prisão de matadores bolsonaristas mostra isso

Sob a alcunha demagógica de “patriotas”, essa gente continuava em ação e matava “comunistas” por alguns trocados. Sociedade precisa dar um basta nisso e quem aplaude é canalha

Escrito en Opinião el
Jornalista e professor de Literatura Brasileira. É especialista em Estudos Brasileiros pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) e tem mais de 23 mil km de sertão nordestino sobre duas rodas. É repórter, editor de colunas e artigos de Opinião e também correspondente da Fórum na Europa.
Brasil segue em risco e prisão de matadores bolsonaristas mostra isso
Fellipe Sampaio/SCO/STF

Mesmo após a derrota eleitoral de Jair Bolsonaro (PL) em 2022 e a iminente possibilidade de sua condenação judicial, que inevitavelmente o colocará por um bom tempo na cadeia, o bolsonarismo como movimento de massa autoritário e violento segue operando nos subterrâneos da política brasileira. Aliás, as camadas em que ele opera nem são tão subterrâneas assim. A operação da Polícia Federal realizada na manhã desta quarta-feira (28), com a autorização do ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal, trouxe à tona mais um capítulo dessa ameaça latente, e eu diria que, talvez, o mais absurdo e sangrento capítulo de história trágica que o Brasil vem atravessando nos últimos anos.

O grupo preso e desarticulado pela PF era composto por militares da ativa e da reserva, recrutados para atuar como assassinos de aluguel. Eles se intitulavam “caçadores de comunistas”, e por óbvio classificavam como “comunista” qualquer cidadão que não compartilhe da visão de mundo hedionda e perturbada deles, assim como aqueles que foram “encomendados” pelos contratantes. Nesse caso, a “ideologia” pouco importa, fazendo valer a máxima imoral do “pagando bem, que mal tem?”. O crime que motivou a operação, cuja vítima era um advogado do Mato Grosso, foi contratado por um fazendeiro bolsonarista, notório por sua idolatria ao ex-presidente de extrema direita. Essa conexão entre o mandante e os executores ocorreu em espaços virtuais identificados como “grupos de patriotas”, um termo que tem sido usado para encobrir práticas criminosas e antidemocráticas gritantes travestidas de suposto engajamento político “pelo Brasil”.

O mais perturbador é que eles tinham uma tabela de preços para matar autoridades e o cardápio previa até assassinatos de ministros do STJ e do STF. Sim, por R$ 250 mil, por exemplo, eles garantem que mandariam Alexandre de Moraes, ou Flávio Dino, para outro plano espiritual. O então presidente do Senado da República, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que àquela altura era nada menos que o presidente do Congresso Nacional, foi monitorado por essa súcia de militares que “por fora” faziam um servicinho de sicários, a mando de extremistas bolsonaristas endinheirados, que eventualmente quisessem ou “precisassem” eliminar alguém.

Para se ter uma ideia do absurdo completo, o coronel que servia como cérebro da milícia de assassinos, identificado pela PF como Luiz Caçadini de Vargas, do Exército, que ou para a reserva em 2019, é investigado como um dos financiadores e promotores dos acampamentos golpistas instalados entre o fim de 2022 e o começo de 2023 por todo o país, com a intenção de derrubar o então presidente eleito Lula (PT). Ele ainda servia como incentivador de ataques aos altos comandantes das Forças Armadas para que, diante da pressão, eles aderissem ao golpe de Estado. Ou seja, mais um típico “patriota” que só quer as coisas direitinho e uma nação “sem corrupção”. Claro, aliciando colegas de farda para formar uma trupe de assassinos de aluguel.

Esses "patriotas", na verdade, são agentes do caos. Alimentados por intolerância, ignorância ou desvio de caráter, atuam como exércitos ideológicos que colocam em risco a estabilidade democrática do país. O alvo dos crimes são, via de regra, pessoas identificadas como "comunistas", categoria vaga, mas útil à lógica extremista de perseguição e eliminação do outro.

É preciso enfatizar: a eleição de Lula não significou a derrota do bolsonarismo. O atual Congresso Nacional é uma prova cabal disso e está recheado de parlamentares que compartilham da mesma visão autoritária e conspiracionista do “mito” fã de torturadores, o que torna a governabilidade um desafio constante. Esses setores extremistas não recuam, não negociam, e seguem ameaçando jogar o país em um abismo social e institucional cujas consequências são imprevisíveis e imensuráveis.

A perspectiva de uma nova eleição presidencial no próximo ano apenas acirra os ânimos. O risco é que esse tipo de violência política volte a escalar, com grupos armados, células organizadas e militantes dispostos a tudo, inclusive a matar, por “ideologia” ou por alguns trocados, para impedir ou reverter o curso democrático.

Mesmo entre os que se opõem ao governo Lula, há um dever moral inegociável, que é o de combater com firmeza os psicopatas extremistas que tentam capturar o país pelo terror. Não há neutralidade possível diante do que está em jogo. Aplaudir, minimizar ou relativizar esse tipo de ação, com o argumento de que se simpatiza com "algumas ideias de Bolsonaro", é compactuar com a barbárie. Se você a pano para isso e não vê o que está ocorrendo como um problema colossal, certamente é um canalha.

Não há patriotismo onde há violência política deliberada e disseminada. Não há democracia onde há milicianos ideológicos que por meio de um Pix metralham com tiros de fuzil qualquer pessoa, já que após o depósito ela se torna automaticamente “comunista”.

É preciso repetir e salientar: não há espaço para omissão diante da escalada autoritária que ainda ameaça o Brasil.

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